Alguns traços de memória de Teresina
As lembranças do passado são
construídas através de fotografias, músicas, livros, revistas, entrevistas, o
relato pessoal de determinados sujeitos
que vivenciaram o fato histórico. Esse acervo material e oral formam a memória coletiva de
uma sociedade. É através desse material
que construímos a história particular de cada época vivenciada por diferentes
sujeitos em determinado local. Esse é um entendimento contemporâneo da história
nos dias atuais.
Partindo do conceito citado acima a ideia desse texto surgiu de uma conversa com
uma amiga, e após ver várias imagens de Teresina durante o ano de 2012 na internet,
fotos que revelam a história da cidade nas décadas de 1960 á 1990. Neste
momento, lembrei-me de alguns fatos vivenciados nesta Teresina provinciana e já
se emancipando para modernidade, termo que custa caro para a história.
Observando
uma foto da ponte Juscelino Kubitschek nos
finais dos anos 70 percebi que naquele local onde hoje está localizado o
Teresina shopping, ali existiam várias casinhas de taipa cobertas de palha,
muitas mangueiras que durante a infância meus amigos chamavam de mangais, isso
eu ouvia muito de colegas que moravam no
bairro Cabral, durante a minha adolescência. Neste local também havia algumas
lagoas, um fato interessante aconteceu na década de 90,
encontraram uma cobra gigante que foi reportagem de TV local.
O lazer naqueles tempos idos, se baseava em uma relação de amizade
bem afetiva, era comum os amigos se reunirem para tomar banho no Rio Poty, naquela
época havia muitas coroas, (isso é Piauiês) pequenas ilhas de areia que se
formavam no meio e na margem do rio ou beira de rio como diz o piauiense. Essa era
uma das diversões e lazer daquele período, além de outras peripécias de menino
danado, como diz aqui em nosso Piauí.
As festas se diferenciavam de acordo coma
classe social, os mais abonados se divertiam nos clubes que naquela época mostravam poderio e glamour.
As pessoas mais simples e humildes divertiam-se em matinês e bailes na casa dos
amigos para festejarem aniversários, casamentos, batizados ou inventavam bingos
e depois dançavam, conversavam com os amigos nesses encontros surgiam também os namoros.
Essa era uma forma que a juventude da
época inventava para se movimentar e sair da mesmice, porém tudo era divertido,
porque ninguém ligava muito para elite, não havia apartheid social pois, interagíamos
com pessoas simples e de melhor posição social. O Importante era a amizade, o nome de família era o
que menos importava.
Outra diversão era atravessar a ponte no final de
semana ou meio de semana, às vezes, para irmos buscar caju e manga na casa de
alguns amigos e barões do jóckey. Naquele tempo as ruas do jóckey não eram
asfaltadas era somente areia.
Dentre estas reminiscências não
esqueço as tardes de domingo na beira do
rio Poty onde hoje é o Teresina shopping, ali saltavam vários paraquedas, essa
era diversão dos domingos. Porém, um fato triste aconteceu com dois
paraquedistas, ambos morreram. O primeiro foi Euclides Marinho, considerado um dos
melhores do Piauí, mêses depois faleceu Marcelo.
Recordo-me ainda que o Estado do PI
editava uma revista toda preta e branca, contendo alguns fatos históricos e culturais
do Piauí. Todo esse material foi perdido na reforma da minha casa junto com os fanzines
underground do final dos anos 80.
Naqueles anos a prainha, na Avenida
Maranhão, em frente o centro
administrativo, era o point do momento. Ali aconteceram muitos eventos esportivos e culturais importantes,
como os festivais de pipa organizado por equipes da Ônix Jeans e grupo
Claudino. Na Área da cultura um evento
que se destacou foi a criação do Rock no velho monge, festival de rock que deu
espaço para bandas novas de Teresina e de outros municípios e Estados, organizado
pelo Walter ( negão) que era funcionário da UFPI, dentre outros caras que
faziam a cena roqueira e a fumaça. Lembro-me um festival que assisti com Vênus,
banda formada por Thyrso, Iko, Pincel e Kinha, uma das melhores bandas de metal
do Brasil, naquela época, ainda tiveram inferno no céu de Parnaíba, banda que o
Joelson tocava, muito boa e Gerude de São Luis, que fazia algo mais pop, nem
existia esse termo por aqui naquela época, ou se fazia rock pesado mesmo, ou
ficava no feijão com arroz. A Teresina daqueles anos, ainda nem ensaiava para o
desenvolvimento dos dias de hoje mas oferecia muita diversão e lazer para a
juventude sedenta de entretenimento. O teatro era outro ponto de encontro da
juventude que frequentava o velho 4 de setembro e o matadouro. Outro lugar onde
rolou alguns shows de rock foi no Diocesano ( diga-se de passagem , um
show lendário de Fator Rh e Flor do Opus ) e na quadra da ETFPI, isso vai ficar para outro
texto sobre o underground em Teresina.
O cinema de destaque da época era o cine Rex, que exibia filmes de Bruce Lee,
Sexual Carnage( Sextrash da Banda do D,D Crazy,ex; Sarcófago). Outros filmes com
grandes bilheterias e filas gigantescas eram
os produzidos pelos Trapalhões. No centro ainda havia o cine o Royal e o cinema do Centro de Convenções. Depois
surgiu na zona leste o Baloon Center que se tornou também muito badalado.
O que é importante frisar, é que éramos
felizes e vivíamos sem as novas
tecnologias de hoje, porém éramos mais próximos uns dos outros. Toda a turma do
barulho, isto é, os primeiros participantes do movimento roqueiro ou underground
de Teresina, tinha encontro marcado na Praça Pedro II (conhecida como PII) na
banca do Mariano para a troca de revistas, zines, informações sobre o rock ou o
que acontecia na cidade; além de demo-tapes ( fitas k-7) com sons de bandas
daqui e de fora que trocávamos pelo
correios.
Outras lembranças inesquecíveis sobre a geração
do rock em Teresina são as apresentações da banda Vênus, que aconteceu durante
duas noites no teatro 4 de Setembro, além do Festival Setembro Rock no Verdão em 1986 e no Centro
de Artesanato em 1987.
Nessa época pela primeira vez em
Teresina tocaram as bandas Chave do Sol de SP, Dever de Classe BA em 1986. Em 1987 a banda
Viper, Vodu ambas de SP e Dorsal Atlântica do Rj. Logo após aconteceu outros
shows como Megahertz, Avalon, Grito Absurdo, Demolidor, Farehneit e outras
bandas que citarei em outro texto. Não podemos esquecer que esta juventude
tinha muita criatividade e pouca grana. Contudo, além de curtirmos muito
fizemos a história do rock em Teresina.
Ainda virá muita coisa boa por aí, não posso esquecer outras pessoas importantes
que contribuíram para todo esse movimento musical tais como: André Luiz,
Edvaldo Nascimento e outros que pesquisarei em breve.
A juventude
roqueira era pequena mas, unida e tinha
muita vontade pra fazer tudo acontecer do jeito que desejávamos. Nos tempos da feirinha na praça Saraiva, dona Sulica era a
apresentadora oficial dos shows, nesta época apresentou os shows das bandas
vênus, mais tarde Megahertz e Avalon que arrebentaram no salão de humor. Enquanto isso,
nós na meladinha tomando cerveja e aproveitando o tira gosto no buraco do Toim,
antigo bar de boêmios, intelectuais e roqueiros de Teresina que ficava na Praça
Pedro II.
Outro fato inesquecível foi a chegada dos primeiros trios
elétricos comandados por Armandinho e cia, visitando Teresina. Nesta ocasião
haviam uns toneis enormes da prefeitura distribuindo cachaça ao povo, isso na gestão de Heráclito Fortes. Tempos de Banda Bandida no centro, as prévias
carnavalescas, surgimento das primeiras
discotecas Aquarius, Mobydick entre outras. Na zona leste o surgimento ..das
primeiras boates no Jockey Club e do Estádio
Albertão lotando nos rivengos de Domingo a tarde. Não existia SKY, as pessoas valorizavam
tanto os times como outras coisas daqui. Nesta época a alegria tomou conta dos
piauienses pois o Tiradentes foi um
sucesso nacional no futebol. Nunca esqueço das manhãs de domingo quando as pessoas em suas residências ficavam ouvindo
Joel Silva, com piqueniques nos quintais,
ao som das radiolas tocando bregas melhores do que os de hoje. Tinha
humor também na tarde de domingo ,antes de irmos ao Albertão ouvíamos o programa Um prego na chuteira com Deusdeth
Nunes, O Garrincha, que tinha como parceria Maria do Buchão, sua esposa
Regina.Isso são alguns relatos que depois continuaremos em alguns ensaios sobre
Teresina e uns meninos terríveis que saiam de suas casas para irem aos shows e
desapareciam por dois ou três dias, deixando sua famílias aflitas.
Relato pessoal de Zenon Camelo Deolindo
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